quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Sandman 4: estação das Brumas


MORFEU NO INFERNO

Sandman – Vol. 4
Estação das Brumas
Argumento - Neil Gaiman
Desenhos – Mike Dringenberg, Kelley Jones, Malcon Jones III, Matt Wagner, P. Craig Russell e George Pratt
Quinta, 27 de Outubro
Por + 11,90€
Depois do interregno proporcionado pelas histórias curtas de Terra do Sonho, o quarto volume da série Sandman que chega às bancas na próxima quinta-feira, volta a centrar-se na saga de Morfeu, o Mestre dos Sonhos, que tem de regressar ao Inferno onde tinha estado no 1º volume para recuperar o seu elmo.
Se há algo que fica bem evidente nesta série, é que as acções têm consequências, que mais tarde ou mais cedo, acabam por se revelar. Vimos na primeira história do 2º volume que Morfeu tinha condenado a uma eternidade no Inferno a princesa Nada, uma mortal por quem se apaixonou, mas que se recusou a ficar a seu lado, mas só durante uma reunião familiar convocada pelo Destino, em que somos apresentados a (quase) todos os Eternos, é que o Senhor do Sonho reconhece que errou e se propõe voltar ao Inferno para corrigir esse erro, mesmo que para isso tenha de enfrentar o poder de Lúcifer, o anjo caído que reina sobre as planícies infernais.
Depois de um episódio centrado nos preparativos para o combate que se adivinhava épico entre Lúcifer e Morfeu, Neil Gaiman surpreende o leitor, pois Morfeu encontra um Inferno deserto e um Lúcifer que, farto das intrigas do Inferno e da forma como os mortais o usam como justificação para os erros e os pecados que cometem, decide abandonar a sua função como guardião do Submundo e a gozar a eternidade no meio dos mortais, deixando o Inferno nas mãos de Morfeu. Uma decisão absolutamente inesperada, que vem alterar o equilíbrio cósmico e a relação entre Céu e Inferno, e que deixa o Mestre dos Sonhos como fiel depositário da chave do Inferno. Um Inferno fechado e deserto, mas que continua a ser uma propriedade muito cobiçada pelos Deuses das mais diversas religiões, que se dirigem ao Domínio do Sonho, para tentarem pelos mais diversos meios que o Mestre dos Sonhos lhes ceda a chave do Inferno.
Em termos gráficos, o principal desenhador deste volume é Kelley Jones, contando com Malcon Jones III na passagem a tinta. A mesma dupla que já tinha desenhado Caliope e Um Sonho de Mil Gatos, duas histórias do volume anterior e cujo estilo barroco se revela perfeito para uma história com um sopro épico como esta, cheia de anjos, deuses e demónios. Veja-se a escala monumental dos portões do Inferno (que parecem saídos de um desenho feito a duas mãos por Druillet e Giger), a forma como trata elementos visuais já familiares ao leitor, como o elmo ou o manto de Morfeu, dando-lhes uma nova aparência muito mais espectacular, ou o modo subtil como a própria imagem de Morfeu se altera conforme os Deuses com que fala, ou a elegância majestática dos seus anjos.
Talvez o mais estranho para os leitores americanos, para quem Thor e Odin são personagens da Marvel, é a imagem que Jones dá deles, muito mais próxima da mitologia nórdica, do que da versão dos Deuses de Asgard criada por Jack Kirby para a “Casa das Ideias”.
Tal como acontecia em Casa de Bonecas, também este volume tem um capítulo que funciona como interlúdio, permitindo algum fôlego aos desenhadores da história principal para conseguirem manter o ritmo de publicação mensal. No caso da história desenhada por Matt Wagner, protagonizada por Edwin Paine e Charles Rowland, dois rapazes mortos que se vão tornar detectives juvenis, descobrimos que o Inferno pode ser um colégio interno inglês, naquele que é o episódio da série mais inspirado na própria vivência de Gaiman. Como refere o autor: “apesar de tudo nesta história ser inventado, este número é autobiográfico. Ou noutras palavras, Charles Rowland sou, em grande parte, eu.”
Publicado originalmente no jornal Público de 21/10/2016

Sem comentários: