segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010
Jodorowsky explora o filão do Incal - Parte II
Depois de na passada semana ter analisado o 1º volume de “O Incal Final”, chegou agora a vez de “As Armas do Metabarão, o segundo dos títulos lançados recentemente pela Vitamina BD, em que Jodorowsky continua a explorar o universo que criou com Moebius para a série “O Incal”.
Pegando no carismático Metabarão, o guerreiro supremo, personagem nascido nas páginas do “Incal”, a “Casta dos Metabarões” explora a genealogia do personagem fazendo-o o último descendente de uma casta de indomáveis guerreiros. Nascia assim uma série directamente inspirada na tragédia grega e que encontrou no traço hiper-realista do argentino Juan Gimenez a tradução ideal para uma história que, por oposição à ficção científica luminosa e espiritual de Moebius no “Incal”, gira à volta do choque entre o metal e a carne, num universo em que as máquinas muito sofisticadas de alta tecnologia convivem com trajes inspirados na Idade Média e na Renascença, num mundo em que a arte e a cultura japonesas têm muito peso, pois o Metabarão tem evidentes afinidades, estéticas e culturais, com os Samurais.
Esta saga de contornos épicos, que já tinha dado origem a uma prequela, “Castaka”, desenhada pelo galego Das Pastoras, prolonga-se neste “As Armas do Metabarão”, cujo principal motivo de atracção residia em ver como o desenho de Travis Charest recriava os personagens de Jodorowsky. Este talentoso desenhador canadiano com uma carreira construida no mercado dos comics americanos, para onde desenhou a série WildCATS e fez capas para várias editoras, viu no convite da editora Humanoides Associés, feito em 2000, para desenhar e pintar a história escrita por Jodorowsky uma oportunidade de desenvolver o seu estilo, sem os constrangimentos de prazos habituais no mercado americano, que o tinham levado a desistir da série mensal WildCATS.
Numa entrevista feita em 2001, quando já estava a trabalhar na história, Charest declarou: "nunca estive tão nervoso com um projecto, como agora. É a primeira vez que pinto e desenho uma novela gráfica sozinho e também nunca estive envolvido com uma personagem tão importante. Para ser sincero, às vezes penso se sei no que me estou a meter. Acho que podem acontecer duas coisas com este livro, ser um grande sucesso e a melhor coisa que já fiz, ou não conseguir acabá-lo e cair lentamente no esquecimento..."
E, apesar de as primeiras imagens serem prometedoras, desde a capa que desenhou para o livro de regras do Role Playing Game dos Metabarões, até "Metabaron: Alpha et Omega", a história curta que desenhou para a revista "Metal Hurlant", que saiu também no nº 1 da edição portuguesa da Devir, infelizmente para Charest, acabou por acontecer a segunda coisa que ele previu e, depois de só ter desenhado 30 páginas em 7 anos, acabou naturalmente por ser substituído por Zoran Janjetov, que já tinha trabalhado com Jodorowsky nas séries "Avant L'Incal" e "Les Technopéres", que desenhou as 22 páginas que faltavam.
Além de se resentir em termos gráficos da mudança, pois Janjetov, sendo um desenhador competente, não chega aos calcanhares de Charest em termos de desenho, trabalho de cor e sobretudo planificação (já para não falar da forma perculiar como Janjetov desenha as sobrancelhas do Metabarão, que mais parecem umas antenas…) também a história se ressente da mudança. Pensada originalmente com uma história de 52 páginas, com o título "Dreamshifters", que não incluía a história curta desenhada por Charest para a "Metal Hurlant", a necessidade de aproveitar todo o material desenhado por Charest, levou Jodorowsky a reescrever a história, acrescentando uma sequência inicial de quatro páginas desenhada por Janjetov, que serve de enquadramento à história curta feita para a "Metal Hurlant". O problema é que assim, sobraram apenas 40 páginas para contar uma história prevista para 52, o que naturalmente implicou uma aceleração na parte final, com prejuízos evidentes em termos da fluidez da narrativa. Resta o prazer (fugaz e cada vez mais raro) de apreciar o espectacular trabalho gráfico de Travis Charest.
“As Armas do Metabarão”, de Jodorowsky, Charest e Janjetov, Vitamina BD, 62 pags, 14,50 €)
Versão integral do texto publicado no Diário As Beiras de 6/02/2010
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1 comentário:
Percebo agora melhor o porquê de tamanha "atabalhoação"! Tirando a arte de Charest, tudo o resto achei bastante fraco. Muito obrigado.
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