quinta-feira, 4 de abril de 2019

Batman 80 Anos 7 - Batman Black & White: Os melhores Contos Noir

Desde que comecei a trabalhar na Devir, em inícios da década de 2000, que me tenho batido pela edição desta série em Portugal, o que esteve quase a acontecer em 2003, no nº 6 da revista Comix, de que era director editorial... se esse número tivesse chegado a sair... Quase vinte anos depois, ele aqui está e eu deixo-vos com o texto que escrevi para o Público a apresentá-lo.

UM HERÓI A PRETO E BRANCO

80 Anos de Batman Vol 7
Batman Black & White – Os Melhores Contos Noir
Argumento – Vários Autores
Desenhos – Vários Autores
Quinta, 4 de Abril
Por + 11,90 €
A colecção dedicada aos 80 anos do Cavaleiro das Trevas prossegue com a publicação, na próxima quinta-feira, dia 4 de Abril, de um volume mítico, Batman Black & White, título perfeitamente elucidativo do conteúdo desta premiada antologia que convidou os melhores desenhadores do mundo dos comics (e não só) a explorarem as imensas possibilidades estéticas e narrativas do preto e branco em histórias de oito páginas.
A ideia, tão brilhante quanto arriscada, pois à época era ponto assente no mundo da edição de comics que o preto e branco não vendia, apesar de honrosas excepções como o Sin City, de Frank Miller, partiu do editor Mark Chiarello que, para além de ter sido editor e director de Arte da DC até há bem pouco tempo, é também colorista e desenhador de BD, tendo assinado títulos como Batman/Houdini: The Devil’s Workshop, uma história da linha Elseworlds escrita por Howard Chaykin. Chiarello, que trabalhou durante 26 anos na DC, antes de ser afastado já em 2019, lembrou-se de criar uma antologia de histórias do Batman a preto e branco, inspirada em revistas como a Creepy e a Eerie. Estas revistas da editora Warren, que recuperaram a herança da E.C Comics, de Bill Gaines, publicaram durante a década de 70 alguns dos melhores trabalhos de sempre de autores como Frank Frazetta, Bernie Wrightson, Ricard Corben e Steve Ditko. Histórias incontornáveis, na sua maioria escritas e editadas pelo mítico Archie Goodwin, de quem Chiarello tinha sido assistente na Marvel, antes de vir trabalhar para a DC, e que assina igualmente alguma das histórias de Batman Black & White.
Para estar à altura dos títulos da editora de James Warren e conquistar os leitores, a antologia editada por Chiarello tinha uma estratégia simples: chamar os maiores nomes da BD de todas as latitudes, muitos dos quais nunca tido qualquer contacto com o Batman, ou com qualquer outro super-herói, para criarem a sua própria versão do Batman.
O resultado foi uma mini-série de 4 números, publicados entre Junho e Setembro de 1996, recolhendo vinte contos noir de oito páginas cada, que inclui no argumento veteranos como Dennis O’Neil, Archie Goodwin, Jan Strnad, Chuck Dixon e Neil Gaiman, para além de grandes nomes da BD mundial que escrevem as próprias histórias, histórias essas que lhes dão a possibilidade de explorar, cada um à sua maneira, os diversos registos possibilitados pelo preto e branco. Em termos gráficos, o elenco é absolutamente de luxo, incluindo desenhadores habituados ao mundo dos comics de super-heróis, como Joe Kubert, Bruce Timm, Howard Chaykin, Walt Simonson, Simon Bisley, Klaus Janson, Matt Wagner, Bill Sienkiewicz, Kevin Nowlan, e Brian Stelfreeze. Artistas com um percurso mais autoral, como Ted McKeever, Kent Williams, Jorge Zaffino, Ted Kristiansen, Gary Gianni e Richard Corben, o mestre da BD underground e figura de proa da revista Metal Hurlant, que teve aqui a oportunidade de relançar a sua carreira, trabalhando com personagens que não criou, mas a que deu o seu toque pessoal, como o Batman.
Mas a grande surpresa desta antologia é a presença de autores de outras latitudes, como o japonês Katshuiro Otomo, o mestre da BD e animação japonesa, criador do mítico Akira, o italiano Tanino Liberatore, desenhador de RanXerox e o argentino José Muñoz, criador, com o seu compatriota Carlos Sampayo do detective Alack Sinner e da biografia em BD da cantora Billie Holiday, também já publicada em Portugal numa parceria Público/Levoir. Mas vejamos o que o prório Muñoz disse sobre essa história, numa entrevista que lhe fiz em 2001: “fui contactado por um editor da DC, Marc Chiarello, um tipo muito simpático, que me convidou a escrever e desenhar uma história curta com o Batman. Como não tinha vontade de escrever a história, disse-lhe que falassem com Archie Goodwin, que é um escritor cujo trabalho admiro, para ser ele a escrever a história. Goodwin aceitou e fez-me uma história verdadeiramente por medida! Nunca falei com ele, mas vê-se que estudou o meu trabalho. É uma história de jazz, em que Batman aparece apenas um segundo, na última vinheta.”
Além dessas vinte histórias curtas, a edição inclui ainda ilustrações de estrelas como Moebius – que escreveu e desenhou uma divertidíssima história, em que fazia uma análise psicanalítica do Batman, que a DC não se atreveu a publicar, tendo acabado por só sair anos depois na revista Penthouse Comix - Frank Miller, Neal Adams, P. Craig Russel, Jim Lee, Alex Toth e Barry Windsor-Smith.
A arriscada aposta de Chiarello acabou por se revelar um sucesso tremendo, ganhando dois prémios Eisner e um prémio Harvey e dando origem a mais três antologias com o mesmo título, publicadas em 2001, 2004 e 2013 e diversas vezes reeditadas. Finalmente, em 2019, os leitores portugueses vão poder descobrir este marco incontornável nas oito décadas de história do Cavaleiro das Trevas.
Publicado originalmente no jornal Publico de 30/03/2019

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