domingo, 20 de janeiro de 2019

As Melhores BDs que li em 2018 - Parte 2


E aqui fica a segunda e última parte da minha lista de melhores leituras de 2018.Uma lista que não foi nada fácil de fechar, pois houve vários títulos que estiveram muito perto de entrar. Títulos como Infidel, de Pornsak Pichetshote e Aaaron Campbell; Gideon Falls, de Jeff Lemire e Andrea Sorentino, Murderabilia, de Alvaro Ortiz, e Watchers, que assinalou o regresso de Luís Louro a solo, com um dos melhores trabalhos da sua carreira. Mas só podiam ser 10 e estes acabaram por ficar de fora...

6 - La Mort Vivante, de Olivier Vatine e Alberto Varanda, ComixBuro/Glenat
Alberto Varanda regressa em grande com à BD com esta adaptação, feita a meias com Olivier Vatine que assina as (magníficas) cores, de um conto de Stefan Wul, nome grande da ficção científica francesa. Obra atípica no percurso de Wul, este La Mort Vivante é tratado por Varanda num registo próxima das gravuras de Gustave Doré, com um trabalho de achuras impressionante, superior até ao de François Schuiten e que se adequa perfeitamente ao ambiente gótico da história.  Consta que Varanda, que estará no Festival de Beja em Maio, demorou sete anos a desenhar esta história. O mínimo que se pode dizer é que foi tempo bem empregue!



7 - Le Storie: Sangue e Gelo, de Tito Faraci e Pasquale Frisenda, Levoir
A grande surpresa da Colecção Bonelli, de que já tive oportunidade de falar aqui. Uma excelente história de Faraci, a que o traço e a utilização  narrativa e dramática da cor feitos por Frisenda dão uma dimensão superlativa.


8 - Mister Miracle, de Tom King e Mitch Gerads, DC Comics
Tom King tem sido presença recorrente nas minhas listas nos últimos anos, mas o mérito é todo dele e das histórias que conta. Neste caso, King refaz a parceria com Mitch Gerads, com quem tinha feito o magnífico Xerife da Babilónia, para conciliar a dimensão épica com a realidade familiar, na sua peculiar versão de Mister Miracle, personagem criado por Jack Kirby na sua saga do Quarto Mundo. História profundamente humana sobre a família, protagonizada por personagens bem mais do que humanas, Mister Miracle é também uma bela homenagem a Jack Kirby, o criador de Scott Free, o ;Mr. Miracle, mas também a Stan Lee, que Kirby parodiou através da personagem de Funky Flashman.


9 - My Favorite Things is Monsters, de Emil Ferris, Fantagraphics
Obra de estreia na BD de Emil Ferris, uma ilustradora de Chicago, My Favourite Thing Is Monsters é um livro tão fascinante como surpreendente, a meio caminho entre a Banda Desenhada e a ilustração. Diário de de Karen Reyes, uma rapariguinha de 10 anos, obcecada por filmes e revistas de terror e que se vê a si própria como um lobisomem, esta novela gráfica apresenta-se como um diário, totalmente escrito/desenhado a esferográfica, em folhas pautadas de um caderno de argolas. Mais do que na vida de Karen, o fulcro do livro são as memórias de Anka Silverberg, a vizinha, sobrevivente do Holocausto que se suicidou, deixando uma série de cassetes em que relata  a sua vida e que Emil Ferris transpõe em imagens, de forma extremamente imaginativa e reveladora de uma grande versatilidade. Para mim, a maior surpresa de 2018.

10- My Heroes Have Always Been Junkies, de Ed Brubaker e Sean Phillips, Image
Outra presença regular nestas listas, a dupla Ed Brubaker e Sean Phillips continuam a produzir as melhores histórias policiais em BD que tenho lido. Este My Heroes Have Always Been Junkies, primeira novela gráfica ambientada no universo da série Criminal, dá-nos a descobrir mais uma personagem fascinante, mas que se revela um perigo para os outros. História muitíssimo bem escrita e desenhada com a extraordinária eficácia a que Phillips nos habituou, My Heroes...tem uma diferença em relação aos últimos trabalhos da dupla: a substituição da colorista Elisabeth Breitweiser, que tão boa conta tinha dado de si em Fatale e Fade Out, por Jacob Phillips, o filho do desenhador. 
Embora pareça um claro exemplo de nepotismo, a verdade é que as cores de Jacobs, que tal como no slogan do Poeta, "primeiro estranham-se e depois entranham-se", acabam por se adequar perfeitamente ao livro.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

As Melhores BDs que li em 2018 - Parte 1


Para compensar a pouca actividade deste blogue nos últimos tempos, a tradicional listagem das minhas melhores leituras de BD de 2018, desta vez sai logo no início de Janeiro. Como sempre, a lista refere-se aos livros que li pela primeira vez durante o ano que passou, independentemente da sua data de publicação original, estando ordenada por ordem alfabética. Aqui ficam os cinco primeiros, de uma lista que podia perfeitamente ser diferente, pois, felizmente, 2018 foi um ano em que li muita coisa interessante. Deixo-vos com a primeira parte da lista. A segunda parte será divulgada durante a próxima semana. 

1 - Afirma Pereira, de Pierre-Henry Gomont (a partir do romance de Antonio Tabucchi), G Floy
Um excelente exemplo do que deve ser uma adaptação à BD de uma obra literária. Uma adaptação que tem em conta as especificidades de cada linguagem, respeitando o espírito da obra de Tabucchi, sem abdicar da sua individualidade. Também visualmente, Gomont consegue transmitir o contraste entre a luz única de Lisboa e o cinzentismo de um país sufocado por uma ditadura, através de um excelente trabalho de cor, utilizando a técnica da serigrafia, que se revela bastante eficaz, tal como o seu traço dinâmico e sintético, em que um registo mais impressionista no tratamento das personagens, contrasta com o rigor com que é retratada a arquitectura de Lisboa.
2 - Angola Janga, de Marcelo D'Salete, Polvo
Obra monumental sobre o célebre Quilombo de Palmares, Angola Janga relata a história deste reino africano na América do Sul construído por escravos negros fugidos dos engenhos durante o século XVII e da luta do seu principal líder, Zumbi, contra as tropas coloniais portuguesas. Projecto ambicioso e muito bem documentado, Angola Janga é claramente o trabalho da vida de Marcelo D'Salete, cujo traço peculiar, não isento de alguma rigidez em termos de movimento, serve perfeitamente as necessidades da história. Uma história muito bem contada, graças a uma planificação eficaz e ao uso de algumas soluções narrativas bem interessantes.
3 - Dampyr 222: Il Suicidio di Aleister Crowley, de Mauro Boselli e Michele Cropera, Bonelli
Juntar numa mesma história Aleister Crowley, Fernando Pessoa, H.P Lovecraft e o terramoto de 1755 parecem demasiados ingredientes para conseguir um bom resultado, mas com todos estes ingredientes Boselli constrói uma excelente história que integra com brilhantismo elementos históricos reais, como o terramoto de 1755 e o suicídio simulado de Aleister Crowley, no universo fantástico da série Dampyr, título que parece ter uma atracção especial por Portugal.
Graficamente, Michele Cropera, cujo estilo lembra Eddie Campbell, o desenhador de From Hell, mas com um traço menos rígido e com outro domínio da anatomia, faz um excelente trabalho, revelando-se rigoroso na reconstituição da Lisboa dos anos 30 e espectacular nas cenas fantásticas. Uma bela homenagem a Pessoa e a Lovecraft, que confirma a excelente qualidade média das edições da editora Bonelli.   

4 - Dylan Dog: Il Nero della Paura 12: Il Vicino di Casa e alçtri raconti, de Ruju, Ribooldi e Romeo, Bonelli
No ano de 2018, por motivos que em breve serão tornados públicos, li mais de uma centena de histórias de Dylan Dog. Histórias de tamanhos variados, que vão desde as 235 páginas de Il Peccatori di Hellborn, um dos melhores trabalhos da dupla Faraci/Roi, até às 8 páginas de algumas histórias curtas, passando pelas 96 páginas das maiorias das histórias da revista mensal. Curiosamente, duas das histórias que mais gostei, são duas histórias curtas, uma de 16 e outra de 24 páginas, publicadas as duas no mesmo número da revista Il Nero della Paura: Il Vicino di Casa e La Vicina di Casa. Duas histórias escritas por Pasquale Ruju e ilustradas respectivamente por Enea Riboldi e por Valentina Romeo, que me recordaram algumas das melhores histórias de Will Eisner, como The Story of Gerhard Shnobble, em que o Spirit é um mero figurante, completamente alheio do que se passa em seu redor. É o que se passa com Dylan Dog nestas duas histórias que se completam, protagonizadas por dois habitantes de Craven Road, que têm o azar de ser vizinhos do investigador do pesadelo. Duas pequenas pérolas, que confirmam a profunda humanidade desta série fantástica.

5 - Emma G. Wildford, de Zidrou e Edith, Soleil 
Já vai sendo tradição a presença de Zidrou nesta lista de melhores leituras do ano, mas torna-se inevitável face à qualidade do trabalho daquele que é para mim o mais interessante argumentista de língua francesa da actualidade. Neste caso, Zidrou conta-nos a demanda de uma jovem inglesa pelo marido desaparecido numa expedição ao Árctico, muito bem ilustrada por Edith, uma desenhadora de grande elegância, já habituada a desenhar a Inglaterra vitoriana, graças à série Basil et Victoria. Um belo livro, servido por uma belíssima edição, cheia de pequenos requintes, que fazem de Emma G. Wildford um belo livro/objecto.
CONTINUA...