Pouco menos de trinta anos após os primeiros contactos, eis que se concretiza o sonho de Hergé de ver o seu Tintin adaptado ao cinema por Steven Spielberg. Tudo começou em 1981, quando Spielberg intrigado com as referências a Tintin nas críticas francesas ao primeiro filme da série “Indiana Jones”, decidiu ler os álbuns de Hergé, nascendo logo aí a vontede de levar Tintin ao cinema. Os primeiros contactos entre Hergé e Spielberg remontam a finais de 1982, mas os dois criadores nunca se chegaram a encontrar pessoalmente, pois Hergé morreu em Março de 1983. Mesmo assim, Spielberg adquire os direitos de Tintin em 1984, para acabar por deixar cair o projecto, que só será retomado décadas depois, quando a evolução da tecnologia o permite.
Descartada a opção do filme com imagens reais, a opção recai na animação em stop motion, técnica usada por Robert Zemeckis, um dos colaboradores habituais de Spielberg, com resultados discutíveis, mas que graças ao filme “Avatar”, de James Cameron, evoluiu muitíssimo nos últimos anos. E, apesar da estranheza inicial de ver um tratamento hiperealista a figuras caricaturais e estilizadas (a aparente simplicidade da “linha clara” de Hergé) o resultado final é muito eficaz e convincente. Parafraseando o célebre slogan publicitário de Fernando Pessoa para a Coca Cola, “primeiro estranha-se, mas depois entranha-se”.
Para isso também contribuem as soluções encontradas para fazer a transição entre os dois registos gráficos, começando pelo excelente genérico do filme, que evoca todas as aventuras de Tintin, até à sequência inicial em que vemos Hergé a desenhar Tintin no seu estilo habitual.
Em termos de história, o filme segue o díptico “O segredo do Licorne”/”O Tesouro de Rackham, o Terrível”, juntando-lhe elementos de “O Caranguejo das Tenazes de Ouro”, para introduzir a personagem do Capitão Hadock, Claro que há algumas simplificações da história original, como a supressão do Professor Tournesol, que não aparece de todo no filme, para darem espaço a algumas cenas de acção originais, que oscilam entre o magnífico (toda a cena de perseguição de moto ao falcão, em Marrocos, digna dos melhores momentos de Indiana Jones) e algo ridículo (a luta de guindastes). Mas o combate entre o Cavaleiro de Hadoque e Rackham, o Terrível está absolutamente espectacular, como espectaculares estão as cenas no deserto.
Mesmo que por vezes, esteja mais próximo de “Indiana Jones” do que dos livros de Hergé, este filme é um exemplo perfeito da aventura em estado puro, com tudo para agradar tanto aos fãs de Spielberg como aos leitores de “Tintin”. Que venha depressa o segundo filme, dirigido por Peter Jackson, a partir de “As Sete Bolas de Cristal e “O Templo do Sol”!
Provando a forte aposta em Portugal, país onde a popularidade de Tintin é forte, o filme, para além das versões Digital e 3D, estreou em três dobragens diferentes: a versão original inglesa, uma dobragem em português e, para aqueles que, como eu, consideram que o Tintin deve falar em francês, como na BD original, uma versão dobrada em francês.
(“As Aventuras de Tintin: O secredo do Licorne”, de Steven Spielberg, com Jamie Bell e Daniel Craig, Universal, Columbia Pictures, 2011. Em exibição em Coimbra nos cinemas Zon /Lusomundo Dolce Vita e Fórum Coimbra)
Versão integral do texto publicado no Diário As Beiras de 29/10/2011
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