domingo, 9 de março de 2014
ALIAN RESNAIS (1922-2014), O CINEASTA QUE GOSTAVA DE BANDA DESENHADA
Nome maior do cinema francês e uma das figuras de proa da Nouvelle Vague, o cineasta Alain Resnais, falecido em Paris no último sábado, dia 1 de Março, com 91 anos, duas semanas depois do Festival de Cinema de Berlim ter premiado o seu último filme, Aimer, Boire e Chanter, era um grande apreciador de Banda Desenhada e a sua obra cinematográfica reflecte isso mesmo.
São essas ligações entre Alain Resnais e a BD, que na generalidade os obituários dos jornais ignoraram, que aqui vos deixo. Grande leitor de Banda Desenhada, não só francesa, como americana, Resnais está ligado às primeiras manifestações ocorridas em França, durante a década de 60 do século XX no sentido da legitimação cultural da BD, integrando como vice-presidente o C.E.L.E.G. (Centro de Estudos sobre as Literaturas de Expressão Gráfica), uma instituição dedicada ao estudo e divulgação da BD, criada em 1962 por Francis Lacassin e a que, além de Resnais estiveram ligados outros cineastas com grandes ligações à BD, como Fellini e Jodorowsky.
Na revista trimestral Giff-Wiff, editada pelo C.E.L.E.G., o cineasta publicou artigos sobre a série Dick Tracy e uma extensa entrevista com Lee Falk, o criador de Mandrake e do Fantasma, que anos mais tarde, Vasco Granja traduziu em capítulos na edição portuguesa da revista Tintin.
A admiração de Resnais por Lee Falk é visível desde logo no documentário sobre a Biblioteca Nacional de França, Toute la Memoire du Monde, de 1956, onde, no meio do espólio da Biblioteca aparece uma revista do Mandrake, de Lee Falk, que pertencia não à Biblioteca Nacional, mas à colecção pessoal do realizador. O mesmo realizador que citava frequentemente em entrevistas a série Mandrake como uma das principais influências do filme O Último Ano em Marienbad, mesmo que essa influência não seja nada evidente para o espectador… Entre os projectos cinematográficos não concretizados de Resnais, estão uma adaptação do álbum de Tintin, A Ilha Negra, nos anos 50 e dois filmes para o mercado americano, na década de 80, com argumento de Stan Lee, o co-criador da maioria dos heróis da Marvel.
Mas, embora nunca tenha adaptado directamente nenhuma Banda Desenhada ao cinema, Alain Resnais recorreu por diversas vezes a criadores de BD nos seus filmes. O primeiro foi Enki Bilal que, para além do cartaz e dos cenários pintados em vidro de A Vida é um Romance, assinou também o cartaz de O meu Tio da América, o filme anterior do cineasta.
Também o desenhador Floc’h, que é autor do retrato de Resnais que encima este texto, assinou os cartazes e os separadores das cenas de Fumar/Não Fumar, de 1993, e de É Sempre a Mesma Cantiga, de 1997 enquanto que, mais recentemente, foi o desenhador Blutch, vencedor do Grande Prémio de Angoulême em 2009. que assinou os cartazes de As Ervas Daninhas, de 2009 e do último filme de Resnais, Aimer, Boire e Chanter, para o qual fez também diversas ilustrações que funcionaram como separadores de capítulos.
Mas o filme que melhor traduz o amor do cineasta pela Banda Desenhada é I Want to Go Home, de 1989, que tem como protagonista um cartoonista americano que viaja para Paris para participar num Festival de Banda Desenhada. Esse filme, onde Gerard Depardieu aparece disfarçado de Popeye, conta com argumento do cartoonista americano Jules Feiffer, que foi responsável pelos argumentos de algumas das melhores histórias do “Spirit”, de Will Eisner e assinou durante décadas, cartoons para o New York Times e a Village Voice.
Versão Integral do texto publicado no Diário As Beiras de 08/03/2014
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